A dimensão metafísica da Animagogia e sua práxis através da Gerontagogia Holonômica
A Animagogia enquanto um processo sócio-educativo para se realizar os
objetivos da Antropolítica do (re)envolvimento humano, na ONGCSF, parte do
pressuposto de que “somos espíritos eternos vivenciando uma experiência
humana”, como afirmou também Pierre Teilhard de CHARDIN, em seu famoso livro O fenômeno humano, e que não deixa de
ser um dogma comum a várias doutrinas religiosas. E o objetivo da existência ou
da humanização do Espírito, segundo a Animagogia, é conseguir vivenciar essa
experiência humanizada com "habilidade espiritual". Esse pressuposto
básico aceita, como hipótese, que a consciência existe de forma independente da
matéria, como também defende os teóricos da Psicologia Transpessoal, como
Stanislav GROF (1987, 1989 e 1994) e outros.
E esse pressuposto, que costuma ser chamado de “metafísico” ou de "não-científico",
está em pé de igualdade com a visão dominante no meio acadêmico que afirma ser
a consciência fruto da vida orgânica que, por sua vez, surgiu da matéria (MONOD,
1970). Porém, "não-científico" é considerar uma das duas hipóteses
como científica e excluir a outra. Afirmar que a consciência é um epifenômeno
da matéria é apenas uma teoria, uma heurística, e não, necessariamente, uma
verdade científica, afirmou Carl Gustav JUNG no livro Psicologia e religião
oriental (s/d). Em suma, como bem alertou o criador da Psicologia Analítica, as
duas interpretações são "metafísicas", tanto a que afirma ser a
consciência um epifenômeno da matéria (criação do cérebro) ou a que afirma sua
existência independentemente da matéria, inclusive a antecedendo.
No caso da Animagogia, a consciência não é tratada como um produto das
reações bioquímicas que ocorrem no cérebro, mas um atributo do Espírito e, no
contexto do (re)envolvimento humano, cujo objetivo é ajudar a despertar os
atributos do Espírito, valorizando-os na vida cotidiana, esse processo se dá,
sobretudo, quando se integra o ego e o Self.
E para não nos perdermos neste jogo de expressões e neologismos, é importante
esclarecer, com mais profundidade, o que é o ego na perspectiva da Animagogia.
O ego seria a consciência humanizada da personalidade, que também pode
ser chamada de mente e que vibra na dimensão chamada Psicosfera. O ego é o
responsável pelas racionalizações humanas, pela linguagem e demais atividades
mentais ditas normais (percepções, representações mentais, emoções), mas também
pelos fenômenos psíquicos como a clarividência e também a mediunidade. Adiante vamos
abordar um pouco mais sobre como é criado o ego, na perspectiva da Animagogia,
demonstrando a importância da vida orgânica para que ele possa existir e diferencia-lo
do Self, que, em tese, traz em si o
registro de todas as experiências humanizadas do Espírito, e da qual o ego
deriva.
No momento, é importante compreender que, na ótica da Animagogia, o ego
representa uma "redução da consciência", desligada dos atributos do Espírito
que, segundo a Animagogia, são inerentes ao Ser e que seriam os seguintes:
1– A consciência de ser um espírito passando por experiências humanizadas;
2 – A vontade de se autorrealizar espiritualmente;
3 – O amor universal;
4 – A fé plena;
5 – A felicidade incondicional;
6 – O agir de forma desinteressada no palco da vida humanizada;
7 – A humildade;
8 – A paciência;
9 – O agir de forma equânime (equanimidade);
10 – O livre-arbítrio;
11 - A criatividade;
12 – A paz interior.
Estes atributos, durante a humanização e encarnação do Espírito, em
tese, são adormecidos, um processo necessário para acontecer as
"provações" espirituais. E o objetivo central dos projetos de
anima-ação cultural com crianças, jovens, adultos ou idosos, realizados pela
ONGCSF, como é o caso do trabalho de Gerontagogia Holonômica, é auxiliar
aqueles que desejam viver com habilidade espiritual a vida humanizada, ou seja,
integrando o ego ao Self para que os
atributos do Espírito se manifestem plenamente para a pessoa ser capaz de
vivenciar sua vida cotidiana com habilidade espiritual.
Assim, as atividades de anima-ação cultural serão os instrumentos para
favorecer o processo metanoico proposto pela Animagogia. Pensando no âmbito
arquetipológico ou mitocrítico, identificamos Orfeu como mito diretor da Animagogia,
que encantava animais ferozes e não lutava, mas acompanhava os argonautas
(heróis) em suas batalhas. E o final trágico de Orfeu e de sua amada Eurídice,
mostra-nos os riscos das tentativas racionalizantes e as artimanhas do ego para
não alcançarmos estes objetivos. A proposta da Animagogia, portanto, é despertar
os atributos que já se encontram, em tese, dentro de cada Espírito humanizado. Porém,
o apego ao ego nos impediria de vivenciar estes atributos no cotidiano. O ego,
caso não seja integrado ao Self,
mantém esses atributos apenas na esfera mental, como intenções racionais, mas
não vivenciados.
Para a Animagogia, os atributos podem se encontrar apenas no campo do
conhecimento, mas não no da sabedoria. Porém, não adiantaria saber quais seriam
os atributos. O importante, no processo animagógico, é vivenciá-los plenamente
no cotidiano.
Segundo a Animagogia, com a integração do ego ao Self, os atributos acima vão, gradativamente, despertando e fazendo
parte da vida humanizada do Espírito. Assim, viver estes atributos cotidianamente
é o que a Animagogia chama de viver com "habilidade espiritual" uma
experiência humanizada. E várias atividades ou vivências podem ser utilizadas
para se alcançar este fim. As atividades que visam esse objetivo são utilizadas
em projetos de anima-ação cultural. Ou seja, elas são meios e não a finalidade
da Animagogia.
Podemos apreender que a Animagogia não possui uma visão materialista do
mundo, mas também não se confunde com o "misticismo quântico",
movimento Nova Era que se expande rapidamente no Brasil e em Portugal,
legitimando-se como "científico", por utilizar as teorias da Física
Quântica fora de seu contexto (os sistemas quânticos) para legitimar suas
crenças esotéricas, espiritualistas e místicas como a de que basta pensar para
mudar a realidade material, atraindo a prosperidade ou qualquer outra coisa que
se deseja, revalorizando o pensamento solipsista, ou afirmando que a matéria só
passa a existir quando olhamos para ela e que cada um cria o seu próprio mundo.
A Animagogia reconhece o valor da Física Quântica enquanto uma
disciplina acadêmica fundamental para descrever a dinâmica do átomo e que os
sistemas quânticos são aqueles cuja irradiação acontecem de forma descontinua e
na forma de pequenos pacotes de energia chamados de quantum. No mundo que se processa na escala humana, a física
clássica ou newtoniana ainda tem seu valor e explica com precisão os fenômenos
físicos que possuem leis, não criadas pelo acaso, mas por uma finalidade
providencial. E a Física Quântica, como apontou BACHELARD (1988) em "O
novo espírito científico", foi fundamental para o surgimento do "materialismo
racionalista" que substituiu o "materialismo realista ou
empírico".
Para a Animagogia, com base nos conhecimentos atuais da ciência
acadêmica, a matéria resulta da energia, mas o Espírito não é energia, como
parece defender o "misticismo quântico". Dizer que o Espírito é
energia é considerá-lo também matéria, é quantificá-lo, desconsiderando o
principio básico que orienta quase todos os movimentos espiritualistas, ou
seja, que o "menor" é que deriva do "maior". No caso, por
ser uma educação espiritualista, o maior aqui seria o Espírito e não a matéria.
O Espírito, para a Animagogia, como já salientado, possui vários atributos,
entre eles, a consciência, a vontade, a capacidade de amar e de ser feliz.
Assim, o Espírito, em tese, irradia e manipula energia; mas esta não é
inteligente. O Espírito sim. Em outras palavras, a energia noética e psíquica produzida
e irradiada pelo Espírito não é "quântica", pois o termo quântico se
refere à forma de medir a energia que forma a matéria, que quantifica experimentalmente
a "vida" que acontece no núcleo e na órbita do átomo. A energia que
forma o átomo pode ser quantificada, mas a energia psíquica não, ou pelo menos não
ainda.
Segundo a Animagogia, o ego, apesar de derivar da consciência, nos
afasta das energias primordiais ou divinas. Mas este processo tem uma finalidade
providencial: ajudar o Espírito a adquirir experiência e sabedoria (que vai
além do conhecimento). Assim, o Espírito precisa desse contato com o mundo
material, que deriva da energia quântica que, por sua vez, deriva da espiritual.
Em outras palavras, a matéria inorgânica (os minerais, por exemplo) traz
em seu interior (no núcleo de seus átomos) energias derivadas do chamado “vácuo
quântico”, mas este ainda não seria a realidade última. O "vácuo quântico”,
que autores como Fritjof CAPRA identificam com o TAO, com Brahman ou com a
realidade última, deriva do plano espiritual, segundo a Animagogia.
O "vácuo quântico" talvez possa ser associado ao prâna das
filosofias orientais, como também costuma salientar Ken WILBER em seus
diferentes estudos sobre a consciência e as energias sutis, particularmente, no
excelente texto denominado rumo a uma
teoria completa de energias sutis[1],
cuja tradução para o português existe na internet.
Assim, a vida orgânica ou material não seria uma mera projeção mental,
no estilo solipsista de pensar. Na Animagogia, ela é importante para que o Espírito
possa experimentar um mundo de sensações, de emoções e de representações
mentais (ego) para que possa, através da intuição ou do despertar dos atributos
do Espírito, reconectar-se ao plano espiritual ou à sua essência eterna, sendo
capaz de vivenciar as vicissitudes da experiência humanizada com habilidade
espiritual, ou seja, colocando em prática os atributos do Espírito, adormecidos
a cada nova encarnação.
A vida humanizada e encarnada do Espírito eterno faria parte de um
"jogo". E vence a partida, na ótica da Animagogia, aquele que
consegue "somar mais pontos", no caso, despertar o máximo possível de
seus atributos espirituais diante das situações ou "provações" que se
apresentam em sua frente, na relação com a natureza, com o Outro e consigo
próprio.
A Animagogia não procura explicar como o Espírito eterno vivenciaria os
demais reinos orgânicos antes de se humanizar, quando começaria, então, a agir
através do ego (razão/vida intelectual), podendo alterar os padrões energéticos
superficiais, causando, inclusive, doenças em animais, plantas e no próprio
planeta. Para a Animagogia o ego está mais afastado das energias divinas, apesar
de derivar delas, pois para cada "etapa evolutiva" é necessária uma
espécie de redução de energias, como acontece com a energia elétrica que chega
aos nossos lares. E, iludido pelo ego, o ser humanizado cria sistemas
políticos, econômicos, culturais, religiosos etc. que, na maioria das vezes, o
impede de viver com habilidade espiritual sua vida humanizada e, ao ser
"derrotado" no "jogo da vida", precisará de uma nova
partida, ou seja, de uma nova encarnação, para tentar novamente ser mais forte
que a matéria.
A Animagogia também não discute se o que acontece em nossas vidas é fruto
do acaso, do livre-arbítrio do ser humanizado ou se é a ação de Deus. Essas
especulações seriam criações do ego para atrasar sua jornada e não ajuda a
despertar os atributos do Espírito diante de qualquer vicissitude ou
"provação". No caso de vivenciar uma vicissitude negativa, não
adianta ficar discutindo o que gerou tal vicissitude, mas viver com habilidade
espiritual aquela vicissitude, seja perdoando, seja agindo com equanimidade, sendo
resiliente etc.
O único ponto de contato entre a Animagogia e o "misticismo
quântico" é o reconhecimento de que a destruição ou a criação do mundo material
é sempre "ilusória", uma vez que a energia proveniente do “vácuo quântico”
não poderia ser destruída. Para a Animagogia, apenas a forma ou o "que se
manifesta" é possível de ser transformado. Assim, por exemplo, a poluição
existe na forma, mas não existe na essência. Enquanto humanizados, sentiremos o
seu efeito, mas, de volta ao plano espiritual, tomaríamos consciência que tudo não
passou de uma espécie de sonho, já que a poluição não afetaria o Espírito, afirma
a Animagogia.
Como é a mesma energia que cria a poluição e cria também um ambiente
saudável, este processo talvez explique um aforismo taoista que afirma o
seguinte: "por mais coisas que fizermos no mundo, não somos capazes de alterar
o mundo". Porém, a diferença fundamental entre a Animagogia e o misticismo
quântico que afirma ser possível mudar a matéria com a força do pensamento,
pois ela seria apenas uma projeção mental, é que para a Animagogia existe uma
finalidade providencial neste processo e as mudanças devem ser processadas no
campo da política, do social, da relação com o meio ambiente, daí ela ser parte
fundamental de um processo mais amplo que é a Antropolítica do (re)envolvimento
humano.
Em resumo, viver com habilidade espiritual a vida humanizada é a
proposta fundamental da Animagogia, o que só seria possível quando se valoriza uma
espiritualidade dinâmica na qual os atributos do Espírito se sobressaem durante
a experiência de vida, auxiliando no processo metanoico capaz de superar as
frustrações e sofrimentos. Na Animagogia, toda e qualquer mudança deve começar
de dentro para fora. Em suma, durante o processo educativo, o participante é
estimulado a refletir sobre suas atitudes, compreender o que causa infelicidade
e o faz sofrer. Em seguida, se faz necessária a autoaceitação dos seus
sentimentos e pensamentos para, numa etapa posterior, assumir a
responsabilidade por seus atos e por suas escolhas, valorizando sua integridade
física, mental, emocional e espiritual, além da responsabilidade social e com o
meio ambiente.
No âmbito simbólico e arquetípico, interpretamos que a relação
envolvimento/(des)envolvimento humano, de acordo com a perspectiva da
Animagogia, nos remete ao mito de Orfeu, como foi salientado. O processo de
(re)envolvimento humano, que compreende uma forma diferente de vivenciar a
natureza, a comunidade, o corpo e, sobretudo, a alma, de uma forma sensível e
compreensível, nos faz lembrar de Orfeu, que costumava ser apresentado como
filho de Calíope, uma das nove musas, com Apolo (em outras narrativas, com o
rei Eagro). Com sua sensibilidade artística fazia com que os animais ferozes o
seguissem, as copas das árvores se inclinassem para ouvi-lo e os homens mais coléricos
sentiam-se penetrados de ternura e bondade (BRANDÂO, 1989).
Como Orfeu, é através de atividades culturais que a Animagogia procura sensibilizar
e despertar os atributos do Espírito, sobretudo, através de programas de
anima-ação cultural realizados com crianças, jovens, adultos e idosos.
Mas o risco da Animagogia é cometer o mesmo erro de Orfeu, ser seduzido
pelas artimanhas do ego e ver sua "Eurídice" se esvair para sempre
nas sombras. Apesar do ego (razão) ser o instrumento que mais nos afasta do
divino, ele é também, paradoxalmente, o instrumento necessário para a
reconexão, para o despertar dos atributos do Espírito, pois é através dele que
acontece o processo de "ascensão" ou de (re)envolvimento com nossa
alma quando ele é integrado ao Self.
Para a Animagogia, como também afirma Krishna na Baghavad Gita, “o ego é um mau
patrão, mas um ótimo servidor.”
Segundo a Animagogia, quanto mais despertamos os atributos do Espírito,
mais aumenta nosso "padrão vibratório" e mais energia do Espírito
puro, de nossa essência, "desce" até nós, seres humanizados,
irrigando cada célula do corpo físico e favorecendo uma mudança de
sensibilidade, ou seja, o processo metanoico que JUNG chamou de individuação.
Quanto à reencarnação, a Animagogia pensa o Espírito como um ser criado
sem experiência ou sabedoria de vida e precisa das encarnações no mundo
material para vivenciar suas "provas e expiações" escolhidas voluntariamente.
Assim, a matéria surge, de fato, da energia dinâmica do universo, também
chamada de "vácuo quântico", mas, para a Animagogia, esta não é a "realidade
última", como afirma o pensamento materialista e também adeptos do
misticismo quântico.
Nesse contexto, a física quântica, ramo importante da ciência
contemporânea, explica como do "vácuo quântico" se cria as diferentes
formas materiais, mas não tem como explicar como o Espírito cria e manipula sua
energia psíquica, por exemplo. Assim, uma bomba atômica, algo possível de se
fazer com os conhecimentos da física quântica, é capaz de acabar com o nosso
corpo material, mas não afetaria em nada o mundo espiritual. Para a Animagogia,
este pré-existe e sobrevive ao mundo material, como também afirmaram os
supostos espíritos para KARDEC, através dos intercâmbios mediúnicos que
originaram a doutrina espírita.
As energias irradiadas pelo Espírito, sejam as psíquicas (pensamento e
emoção) ou as noéticas (imaginação, intuição etc.) não são quânticas segundo a
Animagogia. O dinamismo quântico no interior de um átomo não afetaria a vida
espiritual. Em sua proposta educativa, a Animagogia reconhece uma sequência
natural e ascensional (matéria - energia - espírito - Deus) e os fenômenos
energéticos só podem percorrer um caminho, do maior para o menor. Não há como o
menor afetar o maior, qualquer tratamento terapêutico que utilize a força da
consciência e do sentimento amoroso é tratado como tratamento espiritual na
Animagogia e não como "tratamento quântico". Este último termo seria
adequado para se explicar o funcionamento do átomo e até mesmo para se
construir bomba atômica, mas nunca para explicar práticas espirituais.
No esquema abaixo, retirado do blog da ONGCSF, temos uma representação
de como a Animagogia pensa a relação entre as dimensões. A biosfera seria a
"ordem explicita" que deriva da "ordem implícita". Assim o big bang não manifestaria a criação do
Universo, mas o desdobramento de um universo que já existia.
E a Animagogia se processa através de projetos de anima-ação cultural,
termo que surgiu, pela primeira vez, em minha tese de doutoramento, defendida
em 2003. Sobre este neologismo é interessante salientar que ele foi criado em
um momento singular da minha vida, após trabalhar três anos como animador
cultural do Serviço Social do Comércio (SESC), em várias unidades do estado de
São Paulo. Interessado em inserir propostas de cunho espiritualista na
programação cultural (Yoga, Reiki etc.) e encontrando muita dificuldade, pois
se dizia que tais práticas não estavam de acordo com a política do SESC por não
serem "científicas", deparei-me, certo dia, com uma reflexão
instigante de Teixeira COELHO (1989) em seu livro “O que é ação cultural?”
Neste livro ele expõe sua opção pelo termo ação cultural e o porquê de abominar
o termo animação cultural. Segundo afirma, este último remete à “alma de outro
mundo”.
E foi justamente essa declaração irônica que me chamou a atenção e resolvi
inserir um hífen destacando o termo anima,
criando, assim, o termo anima-ação cultural, refletindo sobre o mesmo em minha
Tese de doutorado (MARQUES, 2003). E esse jogo de palavras nos remete também ao
objetivo da Animagogia, que deixa de ser o negócio (negar o ócio) para
valorizar o sacerdócio (no caso, um ócio sagrado pautado pela valorização da espiritualidade
no cotidiano). Essa perspectiva que podemos chamar de neg-entrópica de pensar a
ação cultural nasceu da minha necessidade de propor um olhar mais “noturno” (DURAND,
1992) sobre a questão, abandonando o imaginário “diurno” e prometéico
predominante no campo da ação cultural, conforme analisamos na Tese de
doutorado citada acima (MARQUES, 2003).
A anima-ação cultural foi pensada como uma forma de ação cultural que
não se pauta pela vontade de querer conhecer, conquistar ou controlar. Suas
atividades visam apenas uma abertura à faticidade do imponderável, do
incompreensível, do inefável, do sensível. Em suma, valoriza o predomínio da
razão simbólica sobre a razão instrumental; ou, em outras palavras, uma
autogestão do tempo vivido sem se prender a uma lógica de utilidade (MARQUES,
2003).
Entre os percalços dessa jornada se encontra, como já salientado, uma
tentativa frustrada de inserir a anima-ação cultural em organizações apolíneas
que, frequentemente, não valorizam o indeterminado, o inconstante, o anômalo, o
contemplativo etc. E projetos de anima-ação cultural podem ser propostos para crianças,
jovens, adultos e idosos dentro ou fora do ambiente escolar, preferencialmente
na educação não-formal ou na ação cultural (seja na Pedagogia Holonômica, na
Andragogia Holonômica ou na Gerontologia Holonômica), rompendo com as
abordagens funcionalistas e intervencionistas e indo além de suas “metáforas
obsessivas”: ordem, ação, desempenho, desenvolvimento, criticidade, atividade e
transformação para acolher também as imagens “crepusculares” que nos remetem
para uma viagem interior e sensível, religando a luz e a sombra, a vigília e o
repouso, valorizando a contemplação e a dimensão subjetiva da vivência temporal
(kairós), em suma, favorecendo o processo animagógico dentro da perspectiva de
um (re)envolvimento humano com nossa alma, nosso corpo, nossa comunidade e com
o meio ambiente.
Podemos dizer que as atividades de um projeto de anima-ação cultural estão
relacionadas com a revalorização do feminino, do sombrio e do ctônico no
universo da ação cultural. Esses elementos que a imaginação "diurna" procura
combater são importantes para fazer brilhar dentro de nós a vida e a luz que
não emana de nós, mas que, definitivamente, estão dentro de nós (JUNG, 1986).
Dentro dos objetivos da Animagogia, as atividades que farão parte de um projeto
de anima-ação cultural visam ajudar no despertar dos atributos do Espírito. Em
outras palavras, podemos dizer que uma mesma atividade, por exemplo, uma aula de
hatha-yoga ou uma sessão de Reiki, pode ajudar a viver o cotidiano com mais habilidade
espiritual ou fortalecer o ego, aumentando a vaidade ou o orgulho. No primeiro
caso, há uma intenção animagógica; no segundo, não.
Assim, as mesmas atividades podem fazer parte de um programa de
anima-ação cultural ou não, dependendo sempre da intenção. Nesta perspectiva, o
importante para que um trabalho educativo possa ser chamado de Animagogia é
verificar sempre a intenção e não a atividade em si. A princípio, qualquer
atividade pode fazer parte de um programa de anima-ação cultural, desde que
estimule e valorize o despertar dos atributos do Espírito, ajude no desabrochar
do Homo spiritualis.
Ao buscar fundamentar a Animagogia, o pano de fundo para a prática da anima-ação
cultural, a ONGCSF organizou vários eventos através do Programa
Homospiritualis, a maioria relacionados com as psicosofias de Buda, Krishna, Lao-Tsé,
Jesus, entre outros mestres espirituais da humanidade. E como o orfismo, que
sofre influências dionisíacas, apolíneas e outras, mas que, ao mesmo tempo,
mantém uma posição de distanciamento em relação às doutrinas que o influencia,
a Animagogia também se constituiu em um movimento complexo, que mantém uma relação
ora complementar e ora antagônica com as psicosofias acima citadas.
E é importante esclarecer o porquê de chamar os ensinamentos destes mestres
de psicosofia e não de religião, filosofia ou de psicologia, como fazem vários
autores. Em primeiro lugar porque estes ensinamentos espirituais não são
teóricos, mas são praticados tanto pelo que ensina como pelos seus discípulos.
Assim, ao contrário da filosofia ou da psicologia que são apenas ramos do conhecimento,
não se constituindo, necessariamente, em uma sabedoria, entendemos com o
neologismo psicosofia um ensinamento que tem valor por meio de sua realização.
Esse fato também nos aproxima, do ponto de vista mitocrítico, de Orfeu, um
"educador da humanidade", e que, segundo BRANDÃO (1989), ensinava e vivenciava
os mistérios órficos com seus discípulos.
Em segundo lugar, a psicosofia não se confunde com a religião, que tem
um corpo doutrinário e um sistema de ritos estabelecidos e nem com a religiosidade,
um comportamento condicionado socialmente e realizado em horas
pré-determinadas, sem que haja, necessariamente, qualquer transformação
interior. Com exceções, podemos dizer que a religiosidade é uma atividade
social e não um trabalho metanoico de transformação espiritual ou interior.
É preciso salientar que estamos compreendo o termo anima-ação cultural
como uma forma específica de ação cultural. E nesse sentido, partimos do
sentido proposto por TEIXEIRA COELHO:
... [a ação cultural] Tem sua fonte,
seu campo e seus instrumentos na produção simbólica de um grupo. E entre as
formas do imaginário que a constituem, as da arte – ao lado de praticas
culturais leigas, mítico-religiosas, etc. – são privilegiadas, por mais que se
diga o contrário. O trabalho com uma modalidade artística em particular pode
até não ser do interesse de uma ação cultural específica. Mas, o que é vital à
ação cultural é a operação com os princípios da prática em arte, fundados no
pensamento divergente (identificado por Gaston Bachelard como o ‘princípio do
diagrama poético’, que consiste em aproveitar, para o processo, tudo o que
interessar, venha de onde vier, na hora em que for necessário, sem o recurso a
justificativas claras e precisas) e no pensamento organizado, e movido pela
possibilidade, pelo vir-a-ser. É esse tipo de pensamento e essa modalidade de
prática, em parte privilegiada também pela ciência mais criativa, que permite o
‘movimento’ de mentes e corpos tão privilegiado pela ação cultural. É esse na
verdade o tipo de pensamento que altera os estados, transforma o estado em
processo, questiona o que existe e o coloca em movimento na direção do não
conhecido. A proposta, portanto, é usar o modo operativo da arte – livre,
libertário, questionador, que carrega em si o espirito da utopia – para
revitalizar laços comunitários corroídos e interiores individuais dilacerados por
um cotidiano fragmentante. (1989, p.33)
E a Gerontagogia Holonômica
enquanto um projeto de anima-ação cultural com adultos e idosos normalmente é
colocada em prática através de várias atividades, como as descritas no livro A
arte de envelhecer com saúde integral e paz interior: introdução à gerontagogia
holonômica, publicado em 2011, Porém, nesta pesquisa, vamos nos concentrar em um
curso realizado entre os anos de 2007 e 2015, chamado de "o poder da
mente", oferecido na Universidade Aberta da Terceira Idade (UATI), na
cidade de São Carlos/SP, com duração de 15 horas.
Cerca
de 300 idosos se inscreveram no curso durante o período acima e durante as
rodas de conversa que abordavam a diversidade religiosa muitos afirmaram (cerca
de 10 %) que eram médiuns atuantes em
diferentes grupos espiritualistas. Em função da ambiência de "cultura de
paz" que o curso proporciona, vários participantes passaram a se sentir encorajados
para afirmar que eram umbandistas ou que frequentavam terreiros de umbanda, fato
muitas vezes negado em outros contextos sociais devido ao preconceito e ao
estigma que essa religião medianímica brasileira ainda carrega.
Com algumas mudanças
de um ano para o outro, o curso "o poder da mente", enquanto um
trabalho no campo da Gerontagogia Holonômica, era realizado através do seguinte
plano de ensino: no primeiro módulo, buscava-se discutir alguns dos vários usos
para a palavra espírito, deixando os participantes apresentarem suas opiniões.
Frequentemente, a palavra espírito era utilizada pelos participantes como
sinônimo de "ser incorpóreo", "fantasma de um morto" ou "desencarnado", o uso mais comum.
Após essa introdução,
acontecia uma aula expositiva sobre o uso do termo em diferentes doutrinas e filosofias,
entre elas, o espiritismo, a teosofia e o budismo, que não crê na sobrevivência
de um Eu após a morte e que se constitui em uma filosofia espiritualista
não-teísta, o que não significa que seja ateia. Além do conceito metafísico de
espírito, também se apresentava o conceito metafórico da palavra, como nos
casos em que aparece relacionada aos valores, cultura e a mentalidade de um
período histórico quando se fala, por exemplo, em “espírito da época”; em seu
sentido psicológico, representando “o conjunto das faculdades intelectuais” ou
no político, quando se fala em “espírito da lei”. Após identificar os diferentes
usos para o termo espírito, discutiamos também como algumas interpretações
religiosas e espiritualistas fazem a distinção entre espírito e alma, como, em
grego, pneuma/psyque e, em latim, spiritus/anima, buscando compreender o que cada termo representa, naquela doutrina.
O segundo módulo do programa era o mais extenso e também suscitava
muitas discussões calorosas. O tema proposto era a relação matéria/consciência.
Como no módulo anterior, os participantes podem se posicionar, apresentando
suas concepções e, em seguida, apresentávamos a concepção cartesiana e
empirista, que fundamentou boa parte da ciência moderna, inclusive no século XX,
e as concepções denominadas não-cartesianas ou pós-cartesianas, entre elas, a
do “misticismo quântico”, presente em boa parte das filosofias e práticas
espiritualistas denominadas "Nova Era" e também a concepção
metafísica da Animagogia, a educação espiritual transreligiosa e laica que orienta
os trabalhos de anima-ação cultural na
ONGCSF apresentada no capítulo anterior.
Neste módulo comparávamos a Animagogia com os ensinamentos de Edgar MORIN
presentes no livro O método 4 – as ideias
e também com as principais teses do movimento identificado como “misticismo
quântico”. Em linhas gerais, a Animagogia parte também do pressuposto que a
vida na Terra só foi possível após o Big Bang
e que a sequência do processo evolutivo é aquele descrito por Jacques MONOD (2006)
no livro “O acaso e a necessidade”,
tese praticamente aceita por toda a comunidade científica: vazio quântico –
reino das subpartículas – átomos e moléculas – reino inorgânico – vida orgânica
– consciência. Porém, a Animagogia tem como axioma
que o Bing Bang não marcou, necessariamente, o início da criação do Universo,
mas a sua expansão ou seu desdobramento. Esta também é a teoria do físico David
BOHM que formula a hipótese de que antes do Big Bang já existia um
"universo de luz".
O pressuposto teórico da Animagogia, que já abordamos, é que, além da
Biosfera, também existem a Psicosfera e a Noosfera, dimensões que se processam
em uma velocidade superior a da luz, onde vibra a consciência que, para MORIN,
no livro supracitado, também associa a Noosfera, mas como um epifenômeno do
cérebro, uma vez que ela, em sua proposta, está imersa na Biosfera e se
decompõe junto com a morte física.
A diferença entre as duas propostas são expostas para os alunos, sem
defender, necessariamente, a Animagogia como sendo a correta. Como para esta
concepção, é a Biosfera que está imersa na Psicosfera, que, por sua vez, esta
imersa na Noosfera, o cérebro é compreendido de uma forma distinta: como um
instrumento necessário para captar as vibrações mentais e espirituais provenientes
daquelas outras dimensões. Portanto, não seria o cérebro o criador dos
pensamentos, mas o organismo necessário para a manifestação das criações
mentais no plano material. Ao contrário da proposta de MORIN, na perspectiva da
Animagogia a consciência permanece existindo em outra dimensão, mesmo com a
morte física.
Porém, apesar dessa inversão paradigmática, reconhecendo a antecedência
da consciência sobre a matéria, a Animagogia não se confunde com o “misticismo quântico”,
que ressuscita a filosofia idealista para a qual a realidade exterior não passa
de uma projeção mental e que, através do
pensamento e da intenção, seria possível manipular a matéria que forma o
mundo exterior, pensamento explicito em filmes populares como "O
segredo" e "quem somos nós?". A distinção da Animagogia com esta
abordagem solipsista também é realizada neste módulo.
Outra perspectiva que é estudada é a proposta por Fritjof CAPRA (1983),
que se não pode ser vinculada ao "misticismo quântico" solipsista,
também pretende relacionar espiritualidade com Física Quântica, associando, por
exemplo, o Tao dos taoistas, o Deus Brahman do hinduísmo ou a "realidade
última" (a causa primária de todas as coisas) como sendo o "vácuo quântico". Nessa perspectiva, o mundus imaginalis se confunde com
a chamada “energia cósmica” que constituiria o mundo material. Na ótica da
Animagogia, semelhante à proposta da Psicologia Transpessoal de WILBER, o "vazio
quântico" seria, no máximo, o campo da criação do Prâna (hinduísmo) ou do
Ki (taoismo). Como o Tao Te Ching (1988) afirma, o Tao é incognoscível e
Brahman, em várias Upanishads (TINOCO, 1996), não pode ser atingido pelo
pensamento. Nesse sentido, para a Animagogia, não seria possível associá-los ao
campo quantizável da física atômica.
Compreendendo um continuum espírito/matéria, de forma homóloga ao
fenômeno físico do som e da luz, a Animagogia parte do pressuposto que a
diminuição da velocidade de ação no plano espiritual é que vai originar a
energia presente no "vácuo quântico" e, consequentemente, a matéria.
O processo inverso também ocorre, porém, enquanto a ciência acadêmica e o "misticismo
quântico" aceitam que da desagregação atômica da matéria surge o vácuo
quântico ou "realidade última", a Animagogia tem como pressuposto que
a energia vai se "desagregar" para voltar a ser um elemento
constituinte de um outro universo, onde se encontra a Psicosfera e a Noosfera,
algo similar ao plano da "ordem implícita" proposto por David BOHM.
Essa tese, de certa forma, é defendida no livro A grande síntese, um livro psicografado escrito pelo médium
italiano Pietro UBALDI.
Como salientamos, este módulo é o mais complexo e o mais longo, mas que
costumava ter uma participação intensa dos idosos que se inscreviam no curso.
Em 2015, convidamos o professor da USP, Osvaldo Pessoa Junior, filósofo e
físico para ministrar uma palestra sobre o tema "física quântica e
misticismo" e cerca de 40 idosos participaram da mesma.
No terceiro módulo do curso, partindo do pressuposto que existiria vida
após a morte ou seja, que o Espírito sobrevive à morte do corpo físico, abordávamos
uma reflexão sobre a possível evolução do Espírito ou não. As filosofias e
religiões como o espiritismo e a umbanda se fundamentam na crença de que o Espírito
é criado simples e ignorante e que, ao longo das encarnações, vai evoluindo até
se tornar um Espírito puro e perfeito. As abordagens orientalistas, porém, e de
forma geral, distinguem o Espírito (Atman), considerado como um ser perfeito, e
o ego, a "personalidade humana". Nesta concepção acredita-se que não
haveria necessidade de evoluir, mas de despertar a consciência espiritual, que
já é pura e perfeita. Esse processo de despertar também é chamado de "processo
de iluminação". Ou seja, a “luz” interior é que se encontra apagada e
precisaria apenas ser "acesa".
A Animagogia considera que os dois processos acontecem, tanto a
"evolução" como a "iluminação". Por ter sido criado sem
experiência e sem sabedoria, é através da vida, seja encarnada ou não, que elas
são adquiridas, logo, há uma "evolução". Por outro lado, os atributos
do Espírito (amor, paz interior, felicidade incondicional etc.) sempre
estiveram dentro dele, são partes constituintes do Ser, portanto, precisam ser
despertados durante a vida cotidiana.
Porém, o que se procura ressaltar nesta reflexão é que, independentemente
de uma ou outra concepção espiritualista, a "evolução" ou a "iluminação"
se processa através da compaixão e da solidariedade, que se intensificam com a
metanoia, ou seja, com a mudança consciencial e de sentimentos chamada de
"processo de individuação" ou "animagógico".
No quarto e último módulo abordávamos alguns eventos considerados
anômalos, transpessoais ou parapsicológicos como a clarividência, a premonição,
a experiência de quase morte etc. Os alunos que participaram do curso, em sua
totalidade, já vivenciaram ou conhecem algum parente ou amigo que vivencia tais
fenômenos e sempre tem uma história para contar. Para as pessoas que vivenciam
tais fenômenos, raramente eles são acontecimentos, mas sim parte da rotina da
vida cotidiana.
É neste módulo que as discussões são mais acaloradas e é possível ouvir
histórias como a de um idoso católico que era muito crítico e não aceitava
outras religiões até que um de seus filhos passa a atuar como médium em algum centro espírita da
cidade. Normalmente, o espiritismo e mesmo a umbanda passam a ser aceitos ou se
quebra o preconceito quando algum familiar que sofria de "perturbações
psíquicas" encontram apoio ou a cura nestas religiões. Esse processo cria
uma faticidade eclética na vida cotidiana, de forma que é possível encontrar
idosos afirmando que vão às missas católicas dominicais, mas não deixam de ir
receber um “passe” em um centro espírita. Outros, além disso, afirmavam fazer
aulas de yoga em algum centro esotérico e não tinham nenhum tipo de conflito
por agirem assim.
O curso "o poder da mente" foi realizado através de 15 encontros
semanais com uma hora de duração. Além do conteúdo acima, no final de cada encontro
uma prática de Meditação Integrativa, de aproximadamente 15 minutos acontecia.
Um fato curioso que se repetiu com frequência, principalmente nos
primeiros anos em que o curso foi ofertado, era um determinado participante
dizer no início do curso que era católico quando se perguntava a sua religião, mas,
com o desenrolar do mesmo, perder o medo e assumir sua religiosidade frente aos demais, dizendo que era
umbandista, por exemplo. Com isso, verificou-se um fato muito positivo.
Inicialmente, tal declaração espantava, e era comum ouvir alguém dizer:
"você frequenta a Umbanda? Mas você é uma pessoa tão boa!"
Estes alunos que, em um primeiro momento,
despertavam a "curiosidade" dos demais, passavam, em seguida, a ser
aceitos com mais naturalidade. Porém, muitos deles ainda acreditavam que são
vistos ou estigmatizados como alguém que possui algum "defeito moral
contagioso" e temem por seus filhos e netos. Ou seja, ainda manifestam o
receio que sua religiosidade possa influenciar negativamente em seus
descendentes. O principal medo é que estes sofram preconceito, bullyng ou outra forma de estigmatização
por serem de uma família de umbandistas, por exemplo.
No caso dos alunos que diziam ser médiuns, ou que tinham amigos médiuns para indicar, eu os convidei para participar de uma pesquisa denominada
"História oral e transcendentalismo: imagens e imaginário do invisível"
apresentada, entre outros lugares, no III colóquio internacional sobre
educação, utopia e imaginário, na UFF, na cidade de Niterói, em 2009. Alguns
depoimentos podem ser acessados no youtube,
como o da senhora Pompéia, que faz comentários muito instrutivos sobre a
sua clarividência, fato que ela afirma vivenciar desde a infância. Os vídeos
com o seu depoimento pode ser acessado através do seguinte link:
A Gerontagogia Holonômica tem como meta ajudar a
fomentar uma "cultura de paz" ou de tolerância e de respeito com quem
pensa de forma diferente. E, ao longo dos anos, esse processo foi se tornando
mais evidente. É fácil viver em paz com quem tem os mesmos pensamentos e
crenças. Mas o desafio é, justamente, aceitar o Outro plenamente. Respeitar a
opção religiosa e construir a Alteridade na vida cotidiana não é uma tarefa
fácil. Há muitas barreiras e desafios, mas o processo educativo é gratificante
quando se nota que o aprendizado do respeito a quem tem crenças diferentes, acontece. A certeza que é possível
existir uma abertura para a alteridade, para a aceitação incondicional do
Outro, é motivadora. Gradativamente, muitos idosos aprenderam que ninguém
precisa deixar suas crenças e nem precisa concordar com as crenças alheias, mas
é de fundamental importância que aprenda a respeitar, sobretudo, quem professa uma
religião não dominante e, inclusive, quem não professa nenhuma.
Após esta introdução à
Gerontagogia Holonômica nos quais a prática da Meditação Integrativa acontece,
vamos, finalmente, abordar o trabalho vivencial. A primeira atividade é
realizada com o objetivo de visualizar os "glóbulos de vitalidade" ou
prâna e compreender o poder da prece e sentir o magnetismo criado nas mãos.
Os participantes são
convidados para olhar relaxadamente para o céu, ao ar livre, mas nunca diretamente para o sol. Depois de alguns segundos, ela começará a
ver pequenos glóbulos prateados no ar. É importante que o participante consiga
distinguir esses glóbulos de outros, mais escuros e que são próprios da retina.
Isso é fácil, pois os de cor acinzentada se locomovem com o movimento do olho,
ao contrário dos prateados que se parecem com pequenos átomos vibrando.
Enfim, quando o aluno
conseguir ver os glóbulos de vitalidade, ainda com os olhos abertos, será
convidado para fazer uma prece mentalmente, de acordo com sua fé religiosa, e
observar o resultado. Em seguida, conversamos sobre a percepção de cada um e
fazemos um exercício de Chi Kung, procurando sentir o magnetismo entre as mãos.
Esse exercício é fundamental e ensinado no primeiro encontro.
Depois que o
participante é capaz de ver os glóbulos pela primeira vez, será mais fácil
fazer outras observações e exercícios. Muitos relatam que passaram a ver os
glóbulos em locais de peregrinação e de oração. E até mesmo no escuro.
Nos encontros
seguintes, eles são convidados para "fluidificar" a água, irradiando
os glóbulos de vitalidade com a força do pensamento. Esta técnica é muito
simples de ser realizada. Quase todos já tomaram "água fluidificada",
"água benta" ou qualquer outro nome que se queria dar. Algumas
pessoas acreditam que apenas médiuns,
padres, monges ou pastores são capazes de energizar a água. Porém, qualquer
pessoa que consiga se concentrar por alguns minutos e faça a experiência com Vontade,
Pensamento elevado, Fé e Amor é capaz de "energizar" a água. A
técnica consiste em encher um copo com água e, durante aproximadamente 10
minutos, envolvê-lo com as mãos e imaginar a água se transformando no remédio que
a pessoa precisa. Quem conhece as essências florais de Bach ou de outro sistema
pode imaginar a essência desejada sendo colocada na água. O mesmo pode ser
feito utilizando cores, por exemplo, se a pessoa é nervosa ou tem insônia, pode
imaginar a irradiação de cor azul para a água.
Também utilizando a
mentalização de cores, há um exercício de Chi Kung, que não deixa de ser uma
espécie de meditação em movimento. Ela também é feita somente após o
participante ter visto os glóbulos de vitalidade e sentir o magnetismo nas
mãos. Esse Chi Kung, em 2001, quando o criamos, era chamado de "mandala-reiki".
Ele é realizado através de movimentos corporais, da respiração pausada e da
mentalização de cores. O objetivo é que o participante faça uma "limpeza energética"
e sinta um fluxo da energia percorrendo e vibrando em seu organismo. Três cores
são básicas: a lilás, no inicio do processo, a dourada para energizar e, por
fim, a azul, encerrando o trabalho. Outras podem ser utilizadas antes do
encerramento, como a amarela para amenizar o estresse mental e aumentar a
capacidade de concentração; a verde para harmonizar e tratar o corpo físico; a
rosa para renovar as emoções e sentimentos e, por fim, a laranja para ajudar na
recuperação de quem passa por momentos de convalescença.
Em outros encontros
realizamos diferentes Meditações Integrativas. A partir de 2015, dependendo do
grupo, são utilizadas as que estão presentes no CD Meditações Integrativas, já
abordadas no capítulo anterior. Como salientado, elas visam a integração do Self com o ego (a consciência humanizada
em estado de vigília) a partir da criação de um estado de hipoatividade
psíquica no participante.
Todas as práticas
acima induzem o participante a uma lenta e progressiva dessensibilização dos
estímulos exteriores, conduzindo-o a um estado sereno e pacífico, em alguns casos
se atinge estados extáticos conhecidos como zazen
e samadhi, relatados pelas filosofias
orientais. Quando isto acontece, podemos dizer que a pessoa atingiu o reino de
Deus ou o nirvana, um estado de
plenitude e paz interior profunda, em uma espécie de fusão com todo o Universo.
Além de
proporcionarem uma sensação de plenitude, as práticas de Chi Kung, as induções
animagógicas das Meditações Integrativas ou a imposição das mãos podem enfraquecer no participante quase todas as
estruturas cognitivas que formam o ego e que, para nós ocidentais, são
“normais”.
E tanto nas práticas de Chi Kung, como na de Meditação Integrativa, a
potência simbólica da ecolinguagem corporal e as induções animagógicas,
respectivamente, favorecem a comunicação/interação entre as energias da
Biosfera, da Psicosfera, da Noosfera e da dimensão espiritual propriamente
dita, de forma que o participante, com frequência, consegue vivenciar uma
abertura lenta e gradual para estados de intro-versão e de intro–visão nos
quais passa a narrar a visualização espontânea de cores, a sensação de muito
calor nas mãos ou uma corrente de vibração agradável dirigindo-se para os pés
ou se espalhando por todo o corpo, ou então, passam a bocejar, a lacrimejar ou
a salivar, sintomas que, segundo médicos taoístas, seriam típicos de "transmutação
de energia estagnada".
Após a prática, muitos narram que se sentem mais aberta e receptiva ao
Outro, à natureza, tornando-se pessoas mais cooperativas e solidárias. De certa
forma, é como se alcançassem a Unidade Inefável por trás das aparências, ou
seja, o Absoluto por trás do contingente, a Eternidade por trás do tempo. Em
suma, o qualitum por trás do quantum, permitindo que "padrões
estagnados de energia" em seu corpo físico (Biosfera) e também no campo
das emoções e dos pensamentos (Psicosfera) fossem desbloqueados e
transformados. E junto com essa "limpeza", relatam a "expansão
da consciência", o que identificamos com o processo de individuação
(metanoia).
Uma das práticas coletivas e que permite ao participante entrar em
contato com as "energias inefáveis", trazendo-lhe uma agradável
sensação de bem-estar e equilíbrio, tanto físico, mental, emocional e
espiritual é realizada colocando no centro a pessoa que vai receber energia,
deitada em uma maca ou em colchonete, enquanto o grupo que enviará as vibrações
forma um círculo em volta daquela.
Nas tradições místicas acredita-se que o centro de um círculo é o foco
de onde parte o movimento da unidade para a multiplicidade, do interior para o
exterior, do eterno para o temporal. Os processos de retorno ao centro são
movimentos de busca da unidade perdida. Por isso o seu centro é considerado em
várias culturas como o umbigo da Terra. O círculo, por sua vez, é o segundo
símbolo fundamental, sendo considerado o centro estendido.
Como o centro, o círculo também simboliza a perfeição, a homogeneidade,
a ausência de distinção ou de divisão. Por isso, o movimento circular é
considerado perfeito, imutável, sem começo ou fim. O círculo remete à simbólica
do tempo e também do céu. Especificamente, ao mundo espiritual, invisível e
transcendente. No centro do círculo todos os raios coexistem numa única
unidade. Essa representação é encontrada, por exemplo, na simbologia do zodíaco
e, na Psicologia Analítica, o círculo representa uma imagem arquetípica da
totalidade da psique, constituindo-se no símbolo do Self.
Para aprofundarmos e fecharmos essa primeira etapa, no capítulo seguinte
apresentaremos o caminho recursivo entre o (re)envolvimento humano, apresentado
anteriormente, e a Meditação Integrativa, visando compreender porque ela é uma
das atividades utilizadas nos programas de anima-ação cultural que mais
contribui para se realizar os objetivos da antropolítica do (re)envolvimento
humano.
[1]
No texto citado acima, e
que pode ser acessado no seguinte endereço eletrônico:
http://www.integralworld.net/pt/subtleenergy-02-pt.html
encontramos as seguintes passagens que demonstram como o pensamento de Ken
WILBER se assemelha com a proposta da Animagogia:
"Vários fatos
intrigantes sobre a realidade quântica como este levaram uma longa lista de
cientistas - de LeShan a Capra, a Zukav, a Wolf (e dezenas que não serão
nomeados) - a comparar o vácuo quântico com algo parecido com espírito, supermente,
o Tao, Brahman, o Vazio do Budismo, e assim por
diante. O resultado, em minha opinião pessoal, foi calamitoso."
"... o potencial quântico não é, de fato,
um domínio radicalmente informe ou não-dual, não pode assemelhar-se a uma
realidade espiritual genuína; pelo contrário, é simplesmente um aspecto de um
reino manifesto que tem qualidades e quantidades, e, portanto, não é o
radicalmente Inqualificável."
"Em outras palavras, o potencial quântico não é espírito e sim prana."
"Em outras palavras, o potencial quântico não é espírito e sim prana."
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